sexta-feira, 17 de julho de 2009

Viagem à "Machamba Nhaule"

Depois de 5 meses e meio numa terra que não é a minha, a conviver com culturas que desconhecia, pessoas cujos comportamentos em outro local do mundo poderiam parecer completamente descabidos daquilo que é considerado o politicamente correcto, eis que gostaria de prestar homenagem a uma das inestimáveis pessoas que irei deixar com bastante saudade quando regressar a Portugal. O meu colega de trabalho Manuel Nhaule…
Este senhor é o responsável das compras da empresa onde estagiei e com os seus 62anos de idade possui a verdadeiro força e atitude de um rapaz de 20, sempre com um sorriso na cara e um piropo para as “gatinhas” (como as chama) por quem passa na rua. Com vontade de ajudar ao belo estilo do desenrasca, consegue arranjar solução para quase tudo num instante.
Sob o seu convite ocasional, acompanhei-o durante a procura pelos melhores preços no mercado, e assim foi-me dada a oportunidade de ir conhecendo a cidade de ponta a ponta. Conversa puxa conversa, muito interessado em história e sobretudo em Portugal, fomo-nos conhecendo e ganhando alguma confiança até que alguns dias atrás me convidou para ir à sua Machamba conhecer a família Nhaule!!!
(machamba – pequena porção de terra de cultivo isolada da cidade onde se costumam reunir para festas, celebrações e almoços em família.)
Um convite para a machamba pode parecer a coisa mais banal do mundo mas pelo que percebi, em Moçambique, convidar um “Mulungo” (branco) para entrar no campo pessoal trata-se de uma honra limitada a poucos sortudos. E orgulhoso mas com algum receio do que estava para vir lá aceitei o convite… Saímos no sábado de manha e pelo caminho parámos à beira da estrada para comprar castanha de caju, cerveja e melhor ainda: coco! Foi a primeira vez que vi abrir um coco com uma catana à minha frente e me ensinaram a beber a sua água e a comer o interior… humm, fresquinho é delicioso!
Chegados, vi que nos esperavam uns bons quilos de carne e um almoço digno de sultão, com costeletas (T-Bone) grelhada, febras, batatas, xima , arroz à discrição e cerveja Heineken. O único prato que não gostei foi guisado de “cabeça de vaca”, mas isso nem em Portugal voltaria a comer… lol J
À medida que iam chegando os restantes convidados, ficavam surpreendidos com a presença de um branco ali, literalmente no meio do mato, a 40km da cidade de Maputo, sem electricidade, rede de telemóvel ou seja, maneira de escapar caso as intenções fossem outras que não as do convívio… Claro que fui porque conhecia bem quem me convidou, dado que são aventuras para NÃO nos metermos sem ter a certeza do que fazemos e para perceber isso bastaram as palavras do ancião da família que quando me viu, me abraçou e disse: “sejas bem-vindo, mulungo corajoso…”! Depois de perceberem que o que eu queria era comer e beber, em 5minutos estavam todos à vontade com a minha presença e eu sentia-me o centro das atenções ao poder falar de Portugal, dos nossos costumes e com alegria deles relembrando o tempo em que a sardinha assada e o azeite constavam das refeições deste povo africano. Quando disse que lá em casa, costumamos ter 3 ou 4 refeições por dia e cada homem só tem direito a ter uma mulher, dado que em Moçambique a riqueza de um homem é medida pelo nº de “casas” ou mulheres que pode sustentar (e elas conhecem-se todas umas às outras) e normalmente há apenas um “mata-bixo” a meio da manha e depois só voltam a comer ao jantar, foi motivo para a risada total…
De barriga cheia, era já quase de noite e sem electricidade por perto, o mato africano fica bastante escuro. Em compensação o céu estrelado e a lua cheia, auxiliados pelos faróis dos carros ajudaram a que ainda fosse possível por uma música de marrabenta e digerir todo aquele manjar.
Chegados ao fim da festa, estava na hora de regressar à cidade, não esperando que a meio do caminho, um dos carros avariasse e voltássemos a parar no meio da estrada nacional sem luz à espera que alguém nos pudesse rebocar! Com a solidariedade de quem passa e uma corda de reboque resolveu-se o problema até à estação de serviço mais próxima…
Outros convites ficaram prometidos e admitiram-me que conquistei o respeito deles ao colocar de lado alguns preconceitos historicamente associados às nossas diferentes origens ao que com orgulho no final o ancião me voltou a abordar e considerar “obrigado pois a tua presença aqui hoje foi mais importante do que possas pensar, a partir deste momento és bem-vindo na família Nhaule”…

Obrigado Manuel, pelos francos ensinamentos ao longo destes meses
Até um dia



Beijos&Abraços
Nuno
























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